Nos últimos anos temos ouvidos muito sobre mudanças para novas economias, tecnologias, modos de educação, relação com o planeta, finalidade do trabalho, modelos de negócio – que por fim – manifestam também, um novo nível de consciência. Portanto, estamos no olho do furação, enfrentando cada um a nossa própria batalha.

O processo de mudança não é diferente para uma empresa, particularmente agora, porque o modelo que orientou o negócio nas últimas décadas está sendo colocado na berlinda. O que era um caminho opcional para as empresas antes do milênio está se tornando um caminho prescrito. A economia global, a tecnologia, as mudanças climáticas, as mudanças geracionais e um cenário sociopolítico em evolução alteram drasticamente as formas como as pessoas consomem, se engajam e abandonam as marcas em suas vidas.

Afinal, o que é um negócio com propósito? Há incoerência entre lucro e propósito? Quais são as trajetórias escolhidas pelas empresas? Como podemos nos colocar neste curso de mudança?

A TENSÃO ENTRE LUCRO E PROPÓSITO

Para um grande número de empresas, negócios com propósito, ainda encontram-se em conflito com o mantra da escola de administração clássica que ditou comportamento corporativo por décadas: o objetivo principal de uma corporação é maximizar lucros e valor para o acionista. É uma noção que foi popularizada pelos economistas na década de 1970, mais notavelmente Milton Friedman.

Entretanto, propósito com conotação de benefício para a sociedade, não é exatamente um tema novo no mundo corporativo. 30 anos antes de Friedman, Theodore Kreps, professor da Faculdade de Negócios de Stanford, cunhou o termo “função social”, na medida em que se esforçou para estabelecer um processo para que as empresas declarassem a sua contribuição para a sociedade. Parece que esta abordagem vem ganhando um destaque nunca visto anteriormente.

A compra da rede varejista Whole Foods Market pela paradigmática Amazon, por US$ 13.7 bilhões, é um sinalizador de que empresas com propósito podem ser atraentes para investidores. Isso porque, a Whole Foods Market, fundada por John Mackey, simboliza o movimento do Capitalismo Consciente. Uma de tantas outras abordagens, que orientam com clareza e coerência o propósito nos negócios. As empresas estão usando seus conhecimentos, habilidades e recursos para resolver alguns dos desafios mais prementes do mundo e percebendo que propósito e prosperidade não são assim tão irreconciliáveis.

 AFINAL, O QUE É UM NEGÓCIO COM PROPÓSITO?

 É importante entender que as empresas podem beneficiar a sociedade de muitas maneiras, e as formas citadas abaixo podem ter interfaces e estar inter-relacionadas, com uma finalidade didática, o propósito pode ser atribuível a três principais aspectos:

  • PRODUTOS: o produto ou serviço oferecido pela empresa carrega um benefício intrínseco a sociedade?

A Airbnb, fez este ano, uma promessa de providenciar habitação a curto prazo para 100 mil refugiados, sobreviventes de desastres e trabalhadores voluntários nos próximos cinco anos. Esses esforços não só estão proporcionando benefícios sociais concretos, como também ajudam a aumentar o negócio, já que quase 50% dos hospedeiros que se juntaram à Airbnb após desastres de 2017 (como o furacão Irma na Flórida) anteriormente não estavam registrados com a empresa.

  •  OPERAÇÕES: o processo produtivo respeita o meio ambiente e as pessoas que trabalham nas operações?

A iniciativa de Agricultura Sustentável da PepsiCo é um exemplo. O programa está ajudando os produtores em todo o mundo a aumentar os seus rendimentos, proteger o meio ambiente, gerenciar melhor os custos e melhorar as condições de trabalho dos trabalhadores. Isso é bom tanto para os produtores quanto para a empresa, fortalecendo sua cadeia de suprimentos global. A PepsiCo espera que a iniciativa cubra mais de 7 milhões de hectares até 2025, representando três quartos de suas despesas agrícolas anuais.

  • COMPARTILHAMENTO: para qual extensão de público e como são compartilhados o benefício da sua empresa?

Um programa iniciado em 2010 pela Merck gigante farmacêutica, tem como objetivo tornar os produtos acessíveis a 80% da população mundial. Na busca deste objetivo, a empresa reduziu os custos de fabricação, fez mudanças na embalagem, distribuição e armazenamento, e tomou outras medidas para ampliar o compartilhamento para aqueles que se beneficiam de seus produtos.

Eu poderia continuar citando o exemplo de inúmeras outras grandes e pequenas empresas, que realizaram uma aliança de sucesso entre fazer o bem, negócios e resultados. No entanto, este artigo é dedicado a todas aqueles antigos ou novos negócios que não fizeram esta reflexão, mas entendem que este pode ser o momento de inspiração para um ponta pé inicial.

“A competição que mantem um homem de negócios acordado à noite não é a dos rivais baixando os preços, mas das pessoas empreendedoras tornando seu produto obsoleto.”  (Joseph Schumpeter)

Ter a clareza do propósito do seu negócio parece ser uma das chaves de sobrevivência no século XXI. Porque a sua marca pode ficar obsoleta pela ausência de contribuição coletiva que ela agrega – e não mais apenas – sobre as novidades do seu produto.

COMO O PROPÓSITO É INSERIDO NA PRÁTICA DO NEGÓCIO?

 Normalmente descobrimos que a mudança não é um processo simples, tem um tempo próprio, está cheia de demandas concorrentes, tem muitas variáveis – portanto é complexa – seja movida pela necessidade ou pela escolha. Por isso, organizei abaixo alguns aprendizados de pesquisadores e empresas, que estão se colocando na trajetória de negócios com propósito, de diferentes pontos de partidas.

1.Para empresas antigas, revisitar o propósito de seus fundadores, ou o objetivo social original da empresa, pode ser o ponta pé de volta ao genuíno, que em algum momento da história da companhia perdeu importância diante de outras prioridades.

2. De outra maneira, olhar para o futuro e identificar tendências, regulamentações e necessidades da sociedade podem indicar como a empresa pode evoluir. O sucesso não parece estar relacionado a objetivos sociais únicos ou altamente inovadores. O que faz a diferença é a capacidade de traduzir propósitos, ainda que simples, em ações consistentes e viáveis através dos sistemas de apoio – estratégias, processos e pessoas.

3. Ao se mover para oferecer valor agregado à sociedade: o coletivo (nós). As marcas não devem se descuidar em fornecer aos consumidores individuais (eu), os atributos prometidos pelo produto e ou serviço em si (funcionalidade, qualidade, durabilidade, inovação, preço).

.Construir uma narrativa clara. Isto significa que não pode ser apenas uma peça de propaganda. Comunicar bem o propósito da organização ao conjunto dos colaboradores, de maneira que eles entendam como seus esforços se encaixam com os demais para alcançar algo maior. As metas financeiras devem ser abordadas, sobretudo como consequência do propósito alcançado. O que motiva os funcionários a alcançar os objetivos sociais deve fazer sentido também do ponto de vista econômico. Esta narrativa, também fundamenta a comunicação com o consumidor ou cliente, porque esclarece os benefícios individuais e coletivos da sua compra.

5. Estimular o intra-empreendedorismo: “pessoas solucionadoras de problemas”, que são motivadas a trabalhar no desenvolvimento de novos modelos de negócios, produtos e serviços para resolver problemas do mundo, como parte de seu trabalho diário, não importa em que função estejam na organização. Os jovens de hoje estão com fome para encontrar significado no local de trabalho. Os negócios com propósito se encaixam perfeitamente para a maioria deles.

6. No entanto, o propósito da empresa, precisa fazer sentido para quem trabalha. Por isso, o autoconhecimento é importante, porque facilita a consciência das causas individuais e como elas se conectam com o propósito coletivo. Isto exige das organizações novas formas para identificar talentos, modelos descentralizados e colaborativos de gestão.

7. Negócios com propósito também são vistos como um mercado a ser explorado pela iniciativa de inovação aberta das empresas. É uma forma ativa e intencional para buscar inovações em novos modos de produzir e consumir, ao mesmo tempo que entendem questões complexas que podem afetar sua posição competitiva futura. As conciliação entre as estratégias de sustentabilidade, de investimento social privado e programas de aceleração para empreendedores ou starups, tem gerado além de integração, um campo fértil para explorar novas perspectivas, modelos de negócios e ótimos retornos para investimentos.

As empresas estão experimentando através de suas ações que fazer o bem, ter bons produtos e resultados, não é só é possível, mas é um novo elemento competitivo. No entanto, deixo aqui uma última provocação para influenciar a sua reflexão.

O que o mundo perderia se VOCÊ desaparecesse? No mais profundo – PROPÓSITO – relaciona-se com o legado que queremos deixar da nossa existência. Sobretudo, com a verdadeira contribuição realizada para a coletividade através da concretização da nossa missão individual, seja ela pessoal ou empresarial.

Simone Faustini é professora, escritora, mentora e atua na Nexus Consultoria, assessorando as empresas a promover relações sustentáveis entre sociedade, meio ambiente e negócios. www.nexusconsuloria.com

Escrito por Nexus