A sustentabilidade dos negócios já percorreu um longo caminho. Desde o alvorecer do movimento ambientalista de 1970. Hoje, mais de 90% dos CEOs afirmam que a sustentabilidade é importante para o sucesso da empresa, desenvolvem estratégias de sustentabilidade, comercializam produtos e serviços sustentáveis e publicam relatórios de sustentabilidade para consumidores, investidores, ativistas e o público em geral.

Por todo esse interesse, deveríamos esperar que o mundo estivesse se tornando muito mais sustentável, o que infelizmente não é verdade. Os dados que mostram isso estão em todos os lugares. O negócio sustentável está atingindo os limites do que pode realizar em sua forma atual. Em vez de mexer nas bordas do mercado com novos produtos e serviços, os negócios agora precisam transformá-lo. Esse é o foco da próxima fase da sustentabilidade do negócio, e já podemos ver sinais de que está surgindo.

NEGÓCIOS SUSTENTÁVEIS QUE TRANSFORMAM O MERCADO

Para reverter os indicadores de mudança climática, por exemplo, o mercado deve se tornar neutro em carbono e, eventualmente, tornar-se negativo. Sabemos que isso não pode ser feito por uma empresa ou por um produto. A sustentabilidade real é propriedade de um sistema.

A noção de uma empresa de energia instalando um parque eólico e se chamando de sustentável não faz sentido na prática. Um sistema de energia mais sustentável incorpora toda a rede, englobando geração, transmissão, distribuição, uso e mobilidade. Já podemos ver sinais dessa mudança acontecendo à medida que novas fontes de energia, energia distribuída, gerenciamento do lado da demanda, aparelhos e medidores inteligentes estão começando a transformar nossas concepções de energia. Os empregos no setor de energia limpa já ultrapassaram os da perfuração de petróleo.

Mas o renascimento da energia vai além. Os veículos elétricos têm o potencial de mudar a rede, nivelar a curva de demanda de eletricidade cobrando à noite e fornecendo capacidade de armazenamento durante o dia para fontes de energia intermitentes, como eólica e solar.

Um proprietário de automóveis Nissan Leaf no Japão pode comprar um transformador para alimentar a bateria de energia. Pesquisas estão em andamento para escalar esse conceito e permitir que os consumidores aluguem suas baterias para as concessionárias enquanto seu carro estiver estacionado. Veículos elétricos também estão transformando a indústria automobilística. Quem poderia ter previsto 20 anos atrás que novos participantes como a Tesla teriam uma maior capitalização de mercado do que a General Motors?

E a medida que a mudança para carros autônomos continua, empresas de TI como Apple e Alphabet entraram na briga, mudando fatores de sucesso no setor automotivo de hardware para software, e com eles, mudam também nossas concepções de mobilidade pessoal. As concessionárias como a Ford, buscam se tornar provedores de mobilidade, para isso elas precisam aprender a operar como a indústria da aviação, onde os lucros aumentam quando seus carros gastam o mínimo de tempo ocioso. Visto que o carro pessoal de hoje está estacionado 95% do tempo, carros autônomos podem resultar em menos carros na estrada (pelo menos nos centros urbanos), já que as pessoas compram serviços de mobilidade em vez de carros próprios. Menos carros na estrada significa redirecionar estradas, estacionamentos, garagens e estações de serviço desnecessárias.

ESTRATÉGIAS DE SUSTENTABILIDADE SISTÊMICAS

Como vemos nos setores de energia e transporte, o escopo potencial de transformação do mercado é vasto. Primeiro, as corporações repensam suas estratégias de negócios para desempenhar um papel mais importante na orientação da sustentabilidade dos sistemas dos quais fazem parte. Em segundo lugar, o próprio modelo de negócios passa por uma redefinição.

Vamos ver mais alguns exemplos destas estratégias que já estão andamento.

A empresa de produtos industriais e de consumo Ricoh concluiu que, até 2050, haverá uma oferta insuficiente de muitas matérias-primas a preços razoáveis para atender às suas necessidades de fabricação. Como ESTRATÉGIA, a empresa está revisando seu modelo de negócios usando a análise do ciclo de vida como base para a tomada de decisões. Estabeleceu uma série chamada “Soluções inteligentes de recursos”, por meio do design e manufatura de produtos, reutilização, coleta, manutenção e recuperação de materiais.

Para mudar o SISTEMA, a empresa também está ajudando seus clientes a reduzir o uso de energia, a pegada de carbono e o uso de materiais virgens, ao mesmo tempo em que expande suas próprias oportunidades de renovação de produtos, reciclagem e novos projetos. As metas incluem a redução do uso de recursos virgens em 25% até 2020 e 87,5% até 2050. Ao adotar o pensamento de economia circular, a Ricoh está se esforçando para ir além das metas de eficiência incremental da própria operação.

As empresas também estão buscando novas parcerias fora do modelo padrão.

Quando a Ford aumentou sua pesquisa e desenvolvimento em transmissões híbridas e elétricas, observou que seus clientes viveriam estilos de vida mais conectados a energia em geral. Juntamente com a Infineon, SunPower, Whirlpool e Eaton, a Ford desenvolveu o programa MyEnergi Lifestyle, explorando maneiras pelas quais os veículos elétricos, sistemas de energia solar, aparelhos energeticamente eficientes e o design das moradias podem ser integrados para reduzir a pegada de carbono total.

A transformação do mercado não apenas induz as estratégias de negócios mais sistêmicas, mas também desafia as formas tradicionais de conceber o próprio negócio. Exige novas concepções de propósito corporativo, noções de consumo e modelos e métricas de sucesso empresarial.

INDICADORES CHAVE DE DESEMPENHO DO PLANETA

O mundo vem testemunhando impactos humanos sem precedentes no ambiente natural que ameaçam a viabilidade da vida na Terra. Para medir essa influência, os cientistas definiram os “indicadores-chave de desempenho (KPIs) do planeta”. São 9 fronteiras planetárias que representam limiares abaixo dos quais a humanidade precisa obrigatoriamente operar. Muitos dos quais não estão indo tão bem. Enquanto o esgotamento do ozônio está se recuperando, os cientistas acreditam que ultrapassamos os limites de três: mudanças climáticas, perda de biodiversidade e fluxos biogeoquímicos (ciclos de nitrogênio e fósforo). Outros indicadores também estão piscando em vermelho, como a acidificação dos oceanos, o uso de água doce e o desmatamento. Os dois limites restantes – poluição química e poluição por partículas atmosféricas – exigem mais dados para avaliar. Todas essas rupturas são o resultado de falhas no sistema natural criadas em grande parte por nossas instituições de mercado.[1]

SERÁ QUE OS NEGÓCIOS PODEM PROMOVER MUDANÇAS EM ESCALA?

O mercado é a instituição mais poderosa do mundo, e o negócio é a entidade mais poderosa dentro dele. O negócio transcende as fronteiras nacionais e possui recursos que excedem os de muitos estados-nação. Os negócios são responsáveis pela produção dos prédios em que vivemos e trabalhamos, pelos alimentos que comemos, pelas roupas que vestimos, pelos automóveis que dirigimos, pela energia que os impulsiona e pela próxima forma de mobilidade que os substituirá. Isso não significa que apenas empresas possam gerar soluções. No entanto, há uma aposta que com sua capacidade de ideação, produção e distribuição, eles estão em melhor posição para trazer a mudança em escala que precisamos.

O capitalismo pode ser bastante maleável. Felizmente, ele é projetado por seres humanos, a serviço dos seres humanos e pode evoluir para atender às necessidades mutáveis dos seres humanos.

Simone Faustini é consultora, professora, escritora e mentora em sustentabilidade. Atua na Nexus Consultoria, assessorando as empresas à promover relações sustentáveis entre sociedade, meio ambiente e negócios.

Referências

[1] WILL Steffen et al., Planetary Boundaries: Guiding Human Development on a Changing Planet,” Science, 347, no. 6223, 2015.

HOFFMAN .Andrew J. The Next Phase of Business Sustainability. Stanford Social Innovation Review. Spring 2018

Escrito por Nexus